vaza pinheiro
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« em: Fevereiro 23, 2009, 00:51:17 » |
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BARROCO
Inicialmente, a palavra barroco era sinónimo de bizarro, sinal de mau gosto e coisa absurda. Com o passar dos tempos e o aparecimento de autores que lhe deram forma e conteúdo, passou a etiqueta histórica e estética, que se dava como equivalente ou palavra substituta de seiscentismo. Na história da literatura portuguesa é um período literário, delimitado, mais ou menos, entre os anos de 1580 a 1680, abrangendo manifestações designadas por maneirismo, gongorismo, eufemismo, preciosismo, etc, períodos não autónomos, mas o prolongamento do classicismo renascentista - em decadência - e a fase inicial do barroco. O termo maneirismo é considerado por J.A. Saraiva e Óscar Lopes como um estilo melancólico que se desenvolveu a partir de Itália, aproximadamente, entre os anos de 1520 e 1600, caracterizado pela subversão das regras vocabulares do estilo renascentista. É um tempo ao longo do qual é possível seguir a lenta formação da estética barroca. Manifestava-se, essencialmente, nos modos do ser e do estar; no falar; nos comportamentos pouco naturais; nos gestos rebuscados; na falta de naturalidade do sujeito; na linguagem poética pouco perceptível, enfim, na procura de efeitos originais.
Em boa verdade, não é possível datar com rigor os limites temporais desta ou daquela corrente literária, pois que, pelo tempo adiante, autores mais ou menos conseguidos sempre mataram a sede criadora naqueles que os precederam. De D. Francisco Manuel de Melo - 1608 a 1666 - considerado em Espanha como a maior figura literária da época, depois de Quevedo, dirá Jorge de Sena: em pleno barroquismo, de que foi alto expoente, foi também o último dos maneiristas.
A valorização do barroco, como atitude de determinados conteúdos humanos, no domínio das Artes Plásticas e da Literatura, estaria ligada ao espírito da Contra-Reforma, servindo e encarnando os ideais daquele movimento. Seria também interpretado como jesuitismo; espanholismo e italianismo importado, através da poesia oficial e dos cortesãos.
No caso do período barroco na literatura portuguesa, podemos situar o seu início nos anos que ocorrem entre a segunda e a terceira décadas do século XVII, pois nesses anos, a publicação de obras e a afirmação de poetas de vanguarda sugerem uma profunda alteração dos padrões literários. Na poesia, atenua-se o tom ascético, coexistindo com a representação do belo e do vistoso. A atitude galhofeira e satiricamente realista torna-se corrente. O carácter artificioso do trabalho poético passa a constituir o fulcro do interesse pelo poema. Sem que se assista a uma ruptura em relação à literatura do período anterior, o panorama poético vai-se alterando: quer na visão do mundo que apresenta, quer nas formas estilísticas por que se exprime. Temos assim. o início de um longo período literário, sob a influência do gongorismo, correspondendo a uma fase promissora da cultura peninsular, pese embora o exagero artificioso de alguns. Importa referir que nos primeiros anos do século XVII é grande a influência da poesia camoneana na estética peninsular. Considerado como o maior poeta renascentista português, duas escolas poéticas terão inspirado a sua obra lírica: a escola trovadoresca peninsular e a escola renascentista italiana - maneirista -desde logo, deixando a sua marca na transição para a estética barroca. Garcia de Resende assinala-o no Cancioneiro Geral.
Muito embora fosse Góngora o grande mentor dos poetas desse tempo, também Camões (1514 ou 1525? - 1580) era um espelho da poesia barroca. Um homem de rupturas: nos ditos graciosos; nas alusões mitológicas, nas metáforas requintadas e na capacidade dialéctica do verbo, cujo suporte mais corrente era o ritmo e a eufonia das palavras. Eram de prata os rios; das lágrimas faziam-se pérolas; havia ouro e diamantes em quase todos os versos. O amor e seus desgostos pessoais, a saudade e a epopeia marítima dos portugueses, perfilam-se numa fase avançada do barroco lusitano. Dizia ele: Tanto de meu estado me acho incerto/Que em vivo ardor tremendo estou de frio/Sem causa, juntamente choro e rio/O mundo todo abraço e não aperto.. Nos Lusíadas, a saga portuguesa dos descobrimentos particulariza a literatura com elementos renovadores: novos símbolos; novas paisagens e costumes; nova portugalidade. Em pleno fervor nacionalista contra o Ultimatum, o diplomata e escritor espanhol Valera desabafará deste modo: os Lusíadas eram o maior obstáculo à sempre pretendida união ibérica e Camões, só ele, levantava contra esse desiderato um muro intransponível, mais difícil de derrubar do que todas as praças e castelos portugueses. Muitos poetas orientaram a sua poesia para a mais lata variedade de temas sobre o mar: saudosismo sentimental ou canto heróico; misticismo religioso; negativismo rebelde; simbologia das vagas, espuma e sargaços; imagens do infinito, etc,. Em Garrett é figura de tema popular. Em Pascoaes é a visão messiânica dum mar filosófico. Em Mário Beirão são novas estrelas e mar de cristo.
Luís de Góngora, 1561 - 1627, criou o movimento gongorista. Mal compreendido na sua época, em virtude da afectação e dos requintes da sua linguagem poética, viu-se ridicularizado por muitos dos seus contemporâneos, como Lopes da Vega e Quevedo. Somente no século XX foi reabilitado e consagrado como uma das maiores figuras da literatura espanhola de todos os tempos. Góngora soube servir-se do engenho para descobrir analogias ocultas no real e no abstracto, tornando-se habilíssimo sonetista onde a metáfora era rainha. A metáfora passou a ser a figura dominante da poética barroca, intrumento criador de um mundo idealizado, diferente do da realidade quotidiana. A leitura atenta da poesia barroca mostra até onde chegou o trabalho sobre as metáforas. Elas não apareciam isoladas, mas em séries. Despenhavam-se em cascata pelo poema, numa festa de imagens e de palavras, particularizando-se ao longo do texto. Com a metáfora articulariza-se a hipérbole. Umas vezes como marcas positivas e instrumento de carácter panegírico: no retrato de mulheres; no louvor a heróis guerreiros; nas homenagens aos detentores do poder, sobretudo, a reis e príncipes. Noutras, como marcas negativas: processos de deformação caricatural, produtora do cómico e do burlesco. Estámos já na fase última do barroco. Os sinais de ruptura são claros na década de 40 do déculo XVII com a publicação do Verdadeiro Método de Estudar, de António Vernney, bem como a criação, dez anos depois, da Arcádia Lusitana, no limiar do pré-romantismo. Pondo termo a este pequeno trabalho, não é de todo impróprio afirmar que o barroco lusitano feneceu com todas as honras nas tertúlias da Marquesa de Alorna.
Bibliografia consultada:
- Coelho, Jacinto do Prado. Dicionário de Literatura, sob a sua direcção, 3ª edição. Figueirinhas, Porto, 1985. - Cunhal, Álvaro. A arte, o artista e a sociedade, Editorial Caminho, SA, Lisboa, 1996. - Pires, Maria Lucília Gonçalves. Poetas do Período Barroco, Editorial Comunicação, Lisboa, 1985. - Saraiva, António José. Cultura e História, Público - Gradiva Publicações, Ldª, Lisboa 1996. - Internet.
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