Jorge Luiz Alves
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...um passeio literário pela boa terra...
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« em: Novembro 10, 2007, 02:02:46 » |
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O som cortou a escuridão feito faca afiada. Ela esticou o braço, ainda sonolenta. Uma réstia de luz vencera os pesados reposteiros, delineando os contornos de proeminentes nádegas acetinadas, envoltas em fina penugem alourada, refulgente, languidez na madrugada que se despedia lenta, preguiçosa. Hora de ir: não - ainda não; sequer conseguira desligar o rádio-relógio... O vulto subia-lhe o dorso, devagar. Estática, braços paralisados de encontro ao rádio, fechou os olhos - toda ela impotente com o progressivo escalar, beijando-a nos tornozelos, subindo em úmidos ósculos pelas pernas, coxas, arrepiando-a mais do que o frescor do falso inverno carioca; ele trabalhava a boca com perÃcia, o rosto quadrado, a barba por fazer arranhando levemente os dois simétricos hemisférios, ancas perfeitas a desafiar a lei da gravidade, mordidas simuladas para não macular o molde forjado em academias; escorregou o feixe de músculos - abdômen em degraus - pela espetacular lomba morena, curvas de sonho recobertas por densas madeixas escorridas à altura da diminuta lordose, alvo de rápido e enlouquecedor saboreio com a ponta de uma lÃngüa indócil. Ao mesmo tempo em que ele, soberano sobre a carne vassala, afastava-lhe os cabelos do pescoço, preparando-se para a faminta arremetida, o rádio decidiu mergulha-los de vez nos mais loucos devaneios: Michel Legrà nd comandou a sincronia dos movimentos, desde o encaixe dos corpos ao posicionamento do arÃete à s portas da cidadela, latejante em veias arroxeadas e teso por saque polpudo, loucura agravada pelo abocanhar da garganta ofertada, quadris que se erguem, servis; áspera face e dentes enormes numa alusão ao lobo no repasto à carótida da rês imolada aos deuses da libido, ela ainda estática, em êxtase sublime, o sax a revelar o verão de 1942, era uma vez dois corpos num só compasso, coxas aprisionando o arÃete inquieto para transpôr o portão, a vÃtima conduzindo e controlando a fera que salivava, arfando, uivando sobre o dorso da corça morena, vÃtima-algoz, gozo chegando, braço ainda estendido em catarse à s obrigações de um mundo opressor e pragmático, nas ondas do rádio a emitir as últimas e mais agudas notas de um solo angelical no coito dos demônios expurgados, branca paz declarada, liberada à s portas do fortim vencedor no orgasmo ao seu modo, mais sublime, enfim desligado - som e prazer, rádio e desejo, cansaço mútuo; é hora, já passou da hora (de novo!, terceira na semana, hoje ainda é quarta); um amanhecer para não ser jamais esquecido. Com certeza: uma data inesquecÃvel. O dia em que ambos, escravos do erotismo, apelo da carne, perderam seus empregos...
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