Abgalvão
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« em: Outubro 05, 2009, 14:23:46 » |
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A noite acontece e a velha cidade se enfeita de luzes de todas as cores… na rua se juntam vergonha e vaidade, promessas, juras e alguns dissabores. Há bares, motéis, discotecas, cinemas, garotas sem graça com ar de adultas… rapazes imberbes com grandes melenas e tipos e tipas de origens ocultas.
Há risos e beijos de bocas pintadas que alimentam sonhos, fecundam paixões… os copos bebidos e as ervas fumadas desnudam prazeres sem limitações. Há moços que exibem as roupas de marca, há moças desnudas com ar atrevido e a dama madura que ouve e embarca na banal cantada dum tipo sabido.
Há cheiros de essências florais e não só que invadem narinas, atraem olhares… olhos e rostos que de olhar metem dó pelo exagero dos suplementares. Há noites alegres e tristes bem mais… noites com luz e muitas outras escuras… noites d’angústia que alimentam os ais e noites perfeitas com ceia e ternuras.
Há noites assentes em provas de amor que acalmam a alma e o coração, noites rasgadas planando ao sabor de ventos que sopram calor e paixão. Há noites gaiatas alegres e sãs que se geram nos reinos da fantasia… noites que parem excelentes manhãs tal qual o poeta pare a poesia.
Mas há noites bem longas, feias, terrÃveis, que ferem ou matam quem nelas se afoita… e noites bem negras e imprevisÃveis p’ra quem no colo da noite se acoita. São as noites de quem na escada do metro sonha, acordado, com enchidos na grelha… da mulher sem tino que fala co’espectro, do homem que amou muito antes de velha.
A noite da dama, decorando a estrada, do guarda que zela riquezas alheias… a do Zé sem tecto cuja cruz pesada macera-lhe os pés disformes, sem meias. A noite da gata que aguarda, felina, os ratos que saem dos canos d’esgoto… do chulo que saca o viço à menina do pulha que atrai, para o carro, o garoto.
As noites de medo que assustam quem tem respeito p’la vida, quer d’outros, quer sua, que mostra valores, que pugna pelo bem, na noite não age, vive, ou actua. A noite do grito na noite sem lua… a do corpo que cai no chão vomitado… do vulto fugindo no escuro da rua após a facada no sentenciado.
Há noites que cheiram a enxofre e sangue noites dos lobos da selva cidade… noites daqueles que nos lodos do mangue criam raÃzes de terror e maldade. E há noites vividas sem sonhos nem horas… noites de azar onde a vida se aposta cavalgando bestas a toque d’esporas… noites de merda, como o diabo gosta.
Há ais e suspiros na boca de alguém na noite soando como uivo ou lamento… monstros sinistros que chegam do além e invadem, dos tolos, o pensamento. Há drogas pesadas nas mãos de vilões… corpos pelo chão ao veneno rendidos… seringas e agulhas cavando infecções demónios dançando em redor dos vencidos.
Abgalvão
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