M. Nogueira Borges
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« em: Junho 17, 2010, 22:31:28 » |
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ISTO
Nunca pensei chegar a “istoâ€. Nado e criado na Ditadura Nacional (depois rebaptizada de Estado Novo), escrita, leitura e tabuada aprendidas com os olhos perscrutadores dos “ salvadores da Nação†pendurados na parede ( Cristo, coitado, parecia que pedia desculpa de lá estar ), enviado para Ãfrica ao som de “ Angola é Nossa “ , recebi , como milhões de nacionais, o 25 de Abril em delÃrio. Continuo a relembrá-lo, a gostar de o ter vivido e agradecido a todos os que derrotaram a mordaça do silêncio, da teimosia e da estupidez. Meu Avô, que conhecera o “ absolutismo†monárquico e a bagunça republicana, avisava-me para me moderar, ver para crer, folhear um pouco mais da História. Não passou muito para o ouvir mais vezes. Entretanto, não autorizou a vida ( ou quis a morte ) que a sua voz se perdesse na minha saudade, de cuja memória vou vivendo. Ainda me lembro dele repetir, de modo veemente, no tempo do homem do Vimieiro, que era preciso poupar “ nos comestÃveisâ€, andar a pé e não chamar o “ carro de praçaâ€. Os meus amigos de Escola comiam uma sardinha dividida por três, subÃamos S. Pedro à procura das “ azedas “ e das amoras, e jogavámos à bola com alguns descalços e calções rasgados no traseiro. Era um tempo de necessidade e de fome, enquanto, no Banco de Portugal, os cofres salazaristas aborrotavam de ouro. A revolução de Abril, fora os exageros, loucuras esquizófrenicas e oportunismos sem dimensão, valeu a pena. Que culpa têm os oficiais, do quadro ou milicianos, que arriscaram a vida na concretização do sonho de liberdade e esperança? Que culpa temos nós do estado a que chegou a Pátria? Empobrecida, endividada, “ de tanga “ ( como dizia alguém), com os seus trabalhadores a suportarem, dos seus bolsos quase vazios, os desgovernos da democracia, as ofensas dos milionários rendimentos duma classe possidente a quem ninguém lava a cara da (des)vergonha, tira os tapetes do luxo e coloca no mocho da decência? Que culpa tem o “ bom Povo Português “ destes milhares de bem “instalados â€, que mandam no que é nosso, gozam o que é nosso, riem do que é nosso, e nos pedem de quando em vez o nosso voto, as nossas palmas, as nossas bandeirinhas, as nossa viagens pagas de autocarro para lhes encherem os recintos? A culpa é toda nossa! Que lhes damos isso tudo para chegarmos a ISTO! E, agora, pelos vistos, já nem as reservas de ouro chegam com a fome, outra vez, ao virar da esquina e os bandos de deserdados nos trilhos “legais†da emigração.
M. Nogueira Borges
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