M. Nogueira Borges
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« em: Julho 06, 2010, 21:58:55 » |
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A LUZ
Não sei há quantos anos – talvez desde que me conheço – que transporto uma imagem-memória sem definição. Bem me esforço por lhe encontrar a forma, a cor e o conteúdo, mas, sempre, baldadamente. Nessa procura me perco sem relógio, num suor de visco, numa dor de impotência, numa aflição Ãntima que o rosto, imperturbável, não traduz. São momentos de luta interior, que tanto ocorrem numa noite de espertina, ou numa balbúrdia do dia, sem resposta para as interrogações. Convenci-me, até, que nunca atalharei o descanso da solução. Uma vezes, aquela imagem surge-me com o revivalismo do já experimentado, mas quando a aprofundo logo se me dissipa a objectivação e tudo é enganoso – na mistura do pensamentoe da lembrança – como uma miragem desértica. Tanto me aparece no roxo da revolta como no rubro da injustiça, no negro da ingratidão como no cinzentismo da apatia, na premência da tristeza como na brevidade da alegria. Há, contudo, uma minúcia que já apreendi: o sentimento da ausência. É isso: a ausência como uma fome nunca satisfeita, uma falta nunca suprida, um espaço sem tempo e sem modo, continuamente à espera de quem o preencha.. Será a ausência de uma alma alheia que na minha se devia encaixar? Será uma incompreensão atávica perante a frieza de um mundo que não há meio de entender? Será uma desconformidade entre uma época sem sentido e um espÃrito inadaptado? Uma ausência, aquém do nascituro, como se o corpo fosse apenas o invólucro dum nome destinado ao cumprimento de uma obrigação genética? Mas se afinal “isto†não se explica, se a vida e a morte são as únicas certezas sem hora marcada, por que buscar, então, no intervalo daquelas, a pacificação do entendimento dessa tal imagem-memória se ela é uma “ausência-ausenteâ€; o mesmo que é dizer uma incapacidade racional – que não uma subjectivação incomunicável - , um vazio que se sofre na contemplação de um retrato que envelhece com o tempo. Vem de longe essa nuvem, sem tempo certo, como uma sombra dos dias – dos dias de sempre - , como uma angústia de exÃlio. Queria na sua substância, demorar-me na sua presença para a saber inteira, porque só assim eu decifraria o seu sentido no relacionamento comigo, mesmo sem adivinhação futura. Bastava detê-la no conhecimento e , depois, largá-la, definitivamente esclarecido no prazer do presente ou na amargura do futuro. Sem essa LUZ identificada, continuarei a gastar palavras e pensamentos, estrada fora da dúvida, essa dúvida que todos temos, que alguns branqueiam nos sorrisos das falsas certezas, paredes meias com o faz-de-conta da (impossÃvel) realização. M. Nogueira Borges em 7/7/10
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