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« em: Dezembro 19, 2010, 19:32:53 » |
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Eram amigos inseparáveis, quase irmãos, até que a vida os forçou a seguir rumos diferentes. O Alfredo, modesto funcionário público, vive em Alfragide, o Matias, uns anos mais velho e empresário abastado, mora na provÃncia. Mesmo assim, rara é a semana em que se não telefonam para actualizar as novidades, inteirarem-se da saúde um do outro, a maior parte das vezes apenas para falarem, sempre saudosos, sempre cordiais. E todos os meses, no último domingo, com pontualidade suÃça, exactamente à s três da tarde, o Matias toca a campainha do andar do amigo Alfredo. Abraços, saudades, apesar de ainda na véspera se terem telefonado. Repete-se então o ritual, como se a visita não fosse habitual: — Trago-te aqui uma lembrançazinha ... — Matias, não te devias incomodar... — Faço questão. É só uma lagostazinha, encontrei-as tão apetitosas que não resisti. E como sei que és perdido por elas e eu as não posso comer... E passava-lhe também belo ramo de flores: — Para a tua senhora, diz, olhando em redor como se a procurasse. — Ah, desculpa-a, apesar de saber que vinhas, teve de se deitar, dói-lhe a cabeça. — E eu que lhe trouxe esta caixinha de Ferrero Roché, o chocolate favorito dela! — Mas põe-te à vontade. Porque é que não lha vais entregar? — Posso? — Amigo, mi casa es tu casa. — Sendo assim, vou-lha levar e inteirar-me da saúde dela, está bem? — Não te demores para atacarmos a lagosta. — Ah desculpa-me, não posso comer marisco. O colesterol! — Ah, pois, esquecia-me. Importas-te que comece? — À vontade. Vou então visitar a tua senhora. Na cozinha Alfredo come carinhosamente a lagosta, abre-lhe as pernas, chupa deliciado o conteúdo; no quarto Matias procede de igual modo com a sua senhora. Se acaso os gritos femininos chegam até à cozinha, se as pancadas contra a cama se sobrepõem à s pancadas do maço de madeira, Alfredo aplaude: — Isso, amigo Matias! Chega-lhe, que tem de durar para outro mês, ao contrário desta lagosta, que não passa de hoje. E quase chora emocionado, ele que tem tão grande amigo que nunca o esqueceu apesar da desigualdade social, que nunca falha a visita mensal sempre com boas prendas, mimos que tanto aprecia e a que jamais poderia chegar — e consola-lhe a mulher, evitando, talvez, que em momento de fraqueza lhe ponha os cornos...
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