Pedro Ventura
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« em: Novembro 20, 2010, 15:37:35 » |
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Chego à plataforma vinte minutos antes da chegada do comboio. Sento-me no banco de ferro, espero. De chofre, ouve-se no altifalante da estação uma voz feminina a dizer que o comboio está atrasado dez minutos, que a previsão de chegada é à s tantas horas e a pedir desculpas pelos incómodos causados. Queimo um cigarro vagarosamente, tentando encapotar a ansiedade. Cada vez que estás para chegar gera-se dentro de mim um frenesi inconcebÃvel, afinal de contas não é a primeira vez que te vou esperar ao comboio. A voz feminina do altifalante ecoa de novo a anunciar mais dez minutos de atraso. Não sei se foi do cigarro que fumei mas secou-se-me a boca e deu-me uma vontade enorme de beber uma cerveja. Ainda dava tempo para beber uma em dois tragos ou três. Desço da plataforma pelas escadas rolantes e dirijo-me ao bar. Com o primeiro trago vejo a cerveja reduzida a metade. Mais dois goles e foi-se. Quando me levanto para entregar a garrafa vazia ao balcão surge de novo a voz feminina a anunciar novo atraso. “Que raios!â€, penso. Logo eu que sou tão pontual e que detesto esperar, mormente quando és tu que estás para chegar, e quando as saudades são tantas. Peço outra cerveja, bebo-a mais morosamente. Apetece-me acompanhar com outro cigarro, mas no local é proibido fumar. Quando me apercebo de tal, acelero a bebericagem para ainda ter tempo de subir de novo à plataforma onde não há restrições para fumadores, e despachar mais um cigarro. Se a senhora do altifalante não voltar a anunciar mais atrasos dentro de momentos o comboio está a chegar, tu estás a chegar. A senhora do altifalante avisa que o comboio vai dar entrada na linha seis e para quem espera por quem há-de chegar ter cautela e não ir além do limite amarelado da plataforma. E finalmente lá desces tu da carruagem, de mala na mão (mala com pouca indumentária, afinal de contas é apenas um fim-de-semana), sorriso largo (descortina-se algum cansaço da viagem no teu semblante), direita ao meu abraço e aos meus beijos. Pego na mala, descemos as escadas rolantes, metemo-nos no carro e zarpamos direitos a casa. Só nessa altura é que o meu frenesi interior se começa a desvanecer. O atraso impede-nos de cozinhar mas não faz mal, compramos comida pelo caminho e comemos em casa. Se há coisa que gosto em nós é de partilharmos o mesmo gosto pelo conforto de estar em casa. E gosto quando chegamos os dois e tiras as tuas coisas da mala. É pena ser só um fim-de-semana, mas a vida é madrasta e por agora tem de ser assim… E quando estamos prestes a matar as saudades acumuladas lá estou eu de novo na plataforma desta vez não para te ir buscar mas para te levar ao comboio. Os dias passaram a correr e torno a casa onde já sinto a tua ausência. E há noite, quando me preparo para fazer a higiene oral vejo que te esqueceste da tua escova de dentes junto à minha. E uma sucessão de pensamentos emergem na minha mente. Entre eles, se terás outra escova de dentes quando chegares a tua casa, mas principalmente, que um dia a tua escova de dentes estará junto à minha não por esquecimento mas porque estamos definitivamente juntos.
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