vitor
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Olá amigos.
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« em: Agosto 22, 2008, 20:16:45 » |
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Adri, um jovem solteiro e solitário, vive na casa mais antiga dum bairro renovado, numa cidade interior e bela, normalmente uma área de imenso calor, é comum usarem-se as janelas quase sempre abertas, semiabertas, e Adri, não foge a regra, e muitas vezes passa ate um certo tempo a janela mesmo, contemplando o movimento e sonhando, especialmente quando vê passarem junto a sua janela, lin-das mulheres, especialmente uma vizinha que raramente vê, mas quando isso acontece, enaltece das entranhas o seu subconsciente que fervilha pelos poros. A uns cem metros vive uma senhora sublime, idade quase como a sua, com um rosto que despertou as noites mal dormidas e Adri, muitas vezes fica, ali plantado, na esperança de ser aquele o dia, ou que possa pelo menos dar-lhe os bons dias. E assim se repetiam as coisas, o movimento era o trivial e as noticias quase iguais, ele representava para si mesmo e ensaiava quase que numa cena para teatro, que dizer a dita pessoa quando um dia a visse passar, juntinho a sua janela, e que dizer-lhe? Não seria fácil, porem, longe de ser difÃcil, basta que possa vê-la, logo se inspirará e as coisas naturalmente irão sair-lhe, resta ver como poderá reagir a dita pessoa, que não conhecendo bem, sente-se nela, pela aparência que já o cativou, mas obra do destino, sempre que se ansiamos alguma coisa parece que se torna pior acontecer, porque será? Mas esperar ou fazer que essa possibilidade surja, se é esta nas suas mãos faze-lo, nem que não seja, lutará. Havia-se confessado uma vez com amigo, vizinho da rua de trás.
- Olá Bruno, tudo bem contigo? Escuta, tens visto por aqui a vizinha? - Qual? - Bolas estas assim? (Riram-se os dois e concluÃram) - Ah desculpa, nova tua paixão… (Tentando imaginar quem seja - e riram de novo) - Vi-a ontem lá em baixo junto à pastelaria, que se passa Adri? (Bruno com um riso desconfiado) - Andas a piscar-lhe os dedos… - Não a tenho visto e nem da janela saio, coisa estranha pá, sonho quase todos os dias com ela, achas isto normal? - Rapaz, anormal não é, ela é cá um borracho… - Mete-te afastado, ou queres entrar na luta por ela? (Riram novamente e como bons amigos que são, obvia-mente que Bruno até o ajudará se for caso disso, pelo menos dizer-lhe se a tal vizinha anda por ali). Ela é Cristina, elegante, cerca de um metro e sessenta e oito de altura, cinquenta e cinco quilos de peso, vive só, separada a uns três anos e raramente é vista com compa-nhias masculinas, algo que tranquiliza, ficando assim a certeza que ela não tem ninguém logo, se ela partilhar das mesmas ideias poderão arrojar-se, e namorariam? Por Adri, até já namoravam… mas ela parece pressentir e evita involuntariamente passar diante da sua janela, entreaberta quase sempre, noite e dia, media luz no seu interior, e as cortinas vagas como um dia esbelto, suaves cores embalam com a breve brisa ali, as vezes Adri sai e verifica o movimento, pensando e pensa, sem que se saiba o que, procura num infinito próximo um sorriso qualquer, que ilumine a sua alma descansada e só. Cristina fala pouco, dizem as más-lÃnguas, há certamente outros olheiros pro-curando nela o mesmo que Adri, enfim, algum chegará certamente, sendo ela quem optará, olha pois claro! A rotina aqui não é incessante. A rua é normalmente calma. Mas porque razão terá surgido na ideia a tal Cristi-na? Por ser apenas bela? Ou a solidão do Adri lhe terá aberto o horizonte a quem raramente vê? E Bruno brinca com o que Adri lhe diz sobre esta estranha paixão, mas que fazer a cegueira do coração, se rendido ao desconhecido o faz feliz?
- Mas porque que raio a terás metido na cabeça amigo? Se dizes que mal a conheces e nunca vês, no mÃnimo, só pode ser loucura, nem tão pouco a tipa anda por estes lados. - Bruno, quando o coração desperta, que fazer a isso? O género de mulher que me deixa louco, acredita, quando a vi outro dia, nem imaginas, por isso mesmo não consegui encontrar coragem de lhe dizer o que quer que seja, fiquei estático, gelei, mas só quem nunca se sentiu fascinado por alguém pensa como tu Bruno, não conseguirás entender. - Estou a tentar despertar-te amigo, com os sentimentos não brinco, garanto, ajudarei no que puder, mas tenho pena de não a conhecer, ou seja, não passa de simples olás, a não ser de a ver, quase como tu, e nem sequer passa des-percebida, é de facto lindÃssima. - Se é, mas não por isso o meu fascÃnio por ela, há sempre alguma coisa que não se consegue explicar, ou razões que a própria razão desconhece.
(Ambos se riem um do outro, embrenhados na mesma filosofia) Despedem-se e cada um segue o seu destino. Adri segue até casa, prepara o que jantar e faz o normal de todas pes-soas. Após jantar e tratar das coisas, loiças e talheres, pre-para-se, veste algo normal e volta à rua, segue em solitária cadência os devaneios de quem como ele, pensa sozinho. As ruas saboreadas num ritmo calmo e na pastelaria, toma o seu café da ordem, e de novo, a caminho, sabendo que fazer certamente, bebe a noite numa calma sua, partilha com o tempo o silêncio e do calor da noite, idolatra a dis-tância do rio bem iluminado onde se reflecte o que de mais belo a noite trás, além do silêncio, claro, a artificial lumi-nosidade oculta enche devagar a cidade, que a cada passo fica mais atrás de si, numa perspectiva lógica, perto da água, acende um cigarro, contempla a saúde dos gritos do vento, suave, encobrem como ecos a música no seu cora-ção. Em que estação de rádio a madrugada se torna mais per-to? Mais que o ruÃdo dos grupos e do centro da cidade, junto ao rio, junto a água, há navios encobertos pelo tem-po, há memórias afagadas na saudade, há desejos de, cer-tamente, navegar como um sonhador das literaturas anti-gas, o resto dos seus dias, numa palma da mão içada ao futuro. Chama a noite, inventa o sonho e dilacera o espaço, ocupando sem vazios os mistérios esquecidos, a cada momento. Pensa, alto talvez, confidencia com o sobe e desce das águas que lhe enchem os pés, entram pelos tor-nozelos calados, mergulhados na areia sentada, sobre o leito do tempo, solta de si, lança aos ouvidos da noite, do mar, do vento, liberta o sentimento como ogivas nucleares, enchendo-lhe o peito numa explosão silenciosa, que o mar escute e partilhe, o incentive ou pelo menos lhe esclareça, se amar resolve sair-se da felicidade. Como lhe escutará o mar? Que resposta irá ele obter daquela solidão, nunca só, mas com o ruÃdo da noite, a silhueta do vento a seu lado, encosta-lhe a face e responde, antes da pergunta. “ O amor é efervescente, sabes como alucina, quando enlouquece, sabes como ferve? “ Provavelmente não sei, talvez nunca tenha sabido sabo-rear desse sumo, desse vinho, desse leito, ouvi dizer sobre ele, li como funciona, já entendi sem que tenha vivido, como actua na alma dos poetas, como fere o coração dos guerreiros, como torna assassinos os amantes, mas quando é belo, e é sempre quando começa, rodopia pelo planeta terra, deixa-o como se fosse uma eterna árvore de natal, com correntes iluminadas à sua volta, com o piscar român-tico de melodias calmas, os olhos fecharem-se ante um coração rendido à mulher que surge, simplesmente ela, apenas natural e normal, com ou sem palavras, se tornam amantes eternos, enquanto durar o sonho. “ Adri caminha lentamente, mais rapidamente junto à s águas, molha-se e nada o incomoda, como reflexo, a alma seca saborosas águas do amor. O vento sempre ali, presen-te, parece querer felicidade também, como a noite, amante do momento, de todos eles, de mar, vento, seguem parados o diálogo secreto, gestos, que importam? Amamâ€. Mais hora menos hora, o regresso a casa, ao local de onde se espera um dia Cristina sentar-se, ao lugar na mesa já imaginado, o sonho continua, e Bruno, amigo de tempos difÃceis, aquele que anima os momentos difÃceis, leva-o a pelo menos sorrir com coisas triviais daquela rua, sempre cáustica quando ela não é vista por ali. Abrem-se as portas do conforto, do lar encantando-se quando se pensa ser um dia, ponto de encontro real das maresias de Adri, como se os dois fossem gente igual, a casa fala certamente a mesma linguagem, a mesma confidência é guardada, as lágrimas preservadas e os armários guardam loiças de futuro, ou os lençóis recolhem quase pela madrugada, o corpo exausto de que Adri se cobre e adormece, sonhando de novo, só que agora dormindo mesmo.
Retornar ao dia é retornar à vida. Certamente o mesmo desejo, esvoaçam-lhe as paredes da casa, a rotina matinal é preenchida como em dias anteriores, o mesmo ideal ocupa o objectivo que avassala, a rua será de novo o primeiro passo do novo dia, após um serão salgado na costa com o vento, entreabertos os olhos e o silêncio, recomeçam a rotina que o obriga e sai. Todos os dias e a mesma hora tomavam café e um pastel de nata, com o amigo Bruno, onde todos os dias costumam encontrar-se. Chegou, entrou e pediu, ao fundo, lá estava já o amigo, sentado com uma calma imprópria para uma cidade como esta, mesmo do interior.
- Viva. Cumprimenta-lhe o amigo e com um clássico aperto de mão. - A noite passou-se, bolas, vontade nenhuma de ter que me levantar pá, mas hoje o dia é corrido na empresa, tenho uma reunião com a administração e o pessoal, tenho que lá estar a horas, e tu, desembucha! - Trazes um ar de quem nem dormiu. Insónia ou pesadelo Adri? Vá, abre-te.
Adri ainda meio ensonado, sem responder, levantou a cabeça, olhou o amigo, sorriram os dois, eram grandes amigos desde crianças, dos tempos de escola, até os pais dos dois, quase vizinhos desde há muitos anos, amigos também, só os do Bruno eram vivos ainda. - Que beleza a minha noite rapaz, dormi que nem um anjo. De novo, como sempre faziam quando algum dizia uma coisa qualquer, pouco importava a importância do assunto, gargalhadas quase desnecessárias, mas confortantes, enchiam a manhã na pastelaria quase repleta de gente, com o mesmo destino marcado para o dia, o trabalho esperava por todos, cada um no seu. - Deixa-me adivinhar. (De novo Bruno, irónico com o amigo). Só ou acompanhado? - Queres saber. - Espera, não digas ainda, vou acertar. Adri levanta o tom de voz. - Desembucha, queres ser bruxo, já vi. (Mais uma gargalhada e Bruno concluiu). - Mas dela, só mesmo o sonho. Parece que és mesmo bruxo. - Não, muitos anos de amizade, esqueces-te disso?
Levantaram-se, foram pagar as contas. Ao despedirem-se, Bruno ao ouvido dizia-lhe com uma calma tÃpica: - Ainda ta coloco nos braços, tem calma, digo isto a sério, acredita.
Adri retorquiu: - Tanto não, mas também ao tempo que a conheces, quem sabe possas dar um toque. (E as risadas de novo lhes enchiam o rosto). - Só preciso que ma apresentes, basta. Bom trabalho e porta-te bem. - Igualmente, se houver novidades anuncio ok? E rua, cada para o seu lado, aos seus trabalhos. Parecia tudo suave, tudo fresco e o dia corria com uma beleza estranha, nada o incomodava, tinha instalado no seu rosto a felicidade, que mais ninguém, a não ser Bruno, sabiam. Dezoito e trinta, o fim do dia de trabalho, iniciava o caminho a casa, toca o telefone e Adri atende. - Alô? (Era o Bruno). - Tudo bem companheiro? - Tudo óptimo, e tu? Bem, mas olha, tenho um convite para ti, queres ir jantar?
Adri sempre caseiro, ainda vacilou, hesitou, lá acedeu.
- Ok, vamos, onde? - Na sala de cristal do hotel Alfa. Quem chegar primeiro espera. - Ainda demoro, vou a casa primeiro, certo? - Ok, ficamos assim, certo? - Tudo bem. Até já. - Ate já.
Lá seguiu e enquanto caminhava, pensava alto. “Só mesmo aquele doido me faz sair depois dum dia destes.†Uma hora mais tarde, chega ao Hotel Alfa, dirige-se a sala, onde tinham combinado o encontro. Qual não é o espanto, uma pessoa especial no grupo, de trás, mal reco-nheceu, mas ao aproximar-se, percebeu tudo. Sentia um frio arrepiante pelos ossos. - Ora viva, chega aqui, (e Bruno simulava uma coinci-dência), vou apresentar-te uma pessoa especial. (Adri che-ga-se), Cristina, apresento-te o meu melhor amigo, de que tenho falado, desde os tempos da escola até ao presente momento, é Adri. Cristina rodou na sua direcção, esboçou um sorriso feliz. - Muito prazer Adri, chamo-me Cristina.
E foram de seguida jantar.
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