Nina Araujo
|
|
« em: Å¿etembro 09, 2008, 15:54:28 » |
|
Vovô Foi Ver o Mar.
-O senhor já foi novo, vô? Esse é você mesmo? O ancião sorria para o neto que esperava exigente por uma resposta do alto de seus cinco anos recém-completos. Embora soubesse que mesmo entre gente grande, muitos ainda pensassem que os velhos nasceram velhos.. -Claro Tom Tom, seu avô foi um rapaz bonito de bÃceps forte e bem mais alto do que é agora. Olhe o meu bÃceps, põe a mão ... Seu Jorge mostrava o braço enquanto aproveitava para explicar ao menino o que era um bÃceps. A criança parecia não acreditar quando viu as fotos do avô surfando naquele pranchão grande, escorregando numa tabuinha à beira-mar ou pegando “jacaré†nas ondas... Só sossegou quando obteve dele a promessa de ensiná-lo a pegar onda daquela forma, no próximo fim de semana. Naquela noite a criança dormiu o sono dos anjos de tão cansada e encantada por ouvir as peripécias do avô e viajar com ele nos anos através das fotos. Quase todos haviam se recolhido quando Eduardo encontrou o pai na sala grande, ouvindo seu disco de choro a meio som para não incomodar. De frente para a janela e olhando o mar com um cálice de licor nas mãos, o homem parecia sereno de olhos cerrados. -Coisa boa essa música papai! -Ô meu filho, você não está escrevendo? -Sim terminei um conto agorinha... E que saber? -Fale! -No final percebi que tudo o que escrevi era sobre você! -Sobre mim? Por que, meu filho? -Estava falando sobre o mar, das vezes em que sofri com saudades dele, quando fui estudar longe, a quantidade de fotos que você me mandava para matar as saudades... quando dei por mim, era você o meu personagem centra! O velho ex-marujo, almirante condecorado, estava emocionado com as palavras do filho, mas o jeito mineiro não deixava a lágrima cair tão fácil assim... -É filho, sou um homem satisfeito! Tenho uma filha linda na Marinha, um escritor que fala do mar, uma mulher velejadora e um neto futuro surfista! Quando minhas cinzas estiverem lá na morada definitiva em alto mar, terei sido a alma mais feliz a habitar entre os corais! -Voce nunca morrerá, meu velho! -Não meu querido, eu sou como uma onda...Mas amanhã tenho uma consulta no médico,hehehehe... Os homens ficaram ali por muito tempo, saboreando os acordes e o barulho doce das marolas, numa noite de verão carioca.
Nina Araújo
|