Guacira
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« em: Janeiro 03, 2010, 19:52:55 » |
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Quanto à Mona Lisa, em outro contexto poder-se-ia também considerá-la uma mulher cujo olhar teria implÃcita uma dose de sensualidade, uma sedução que pudesse ser avaliada como ‘nociva’? E se ao invés de uma pintura, o autor a tivesse criado mais próxima da realidade da dinâmica da vida, através de um romance, se falaria apenas do seu sorriso? e quanto ao seu olhar? Para mim, o olhar da mulher retratada antecede com bem mais eloquência o tão discutido, enigmático e inexplicável sorriso; e muito também já se falou, discutiu e escreveu, tentando decifrá-lo! Parece que há uma intenção em estimular o imaginário das pessoas e preservá-lo como uma incógnita ( estabelecendo um elo com o olhar da Capitu); haveria uma tentativa de conservar o mistério e valorizar ainda mais a obra, despertando a curiosidade das pessoas e incutindo em suas cabeças certa dificuldade em decifrá-lo? A técnica da repetição poderia estar funcionando aqui, como funcionou em relação à Capitu? Com que intenção se poderia ter criado tal polêmica? Consideremos que só se começou a falar nesse mistério a partir do século XIX; antes disso aquele sorriso não era considerado enigmático nem chamava a atenção, porque era comum na corte italiana do século XV certos comedimentos, não sendo o sorriso uma decisão pessoal, existindo até códigos de comportamento disponibilizados em livros para as pessoas. Num desses livros o autor, Baldasse Castiglione, dava conselhos para que fosse evitada a afetação, como se esta fosse uma seara perigosa. Dizia ser interessante usar a sprezzatura, para fazer privado o que se dizia e/ou se pudesse fazer socialmente, ou seja, usar a arte do disfarce para ocultar peculiaridades pessoais. Outro autor, Agnolo Firenzuola, sugeriu que a arte da moderação e abrandamento incluiria sorrisos; inclusive diz que “ao sorrir as senhoras deveriam manter fechado o lado direito da boca enquanto abririam suavemente e brevemente o esquerdo, como se sorrissem secretamente...†Logo, o mistério fabricado se desfaz se entendemos que os pintores da época nada fizeram senão acolher o estabelecido e retratar um costume, um código social de comportamento!... Eu não seria louca o bastante para colocar em cheque o valor da técnica de Leonardo, ou o valor artÃstico da sua obra; nem pensaria nisto. Mas, na Literatura temos o exemplo de Shakespeare, hoje um Ãcone de difÃcil acesso que confere status a quem diz conhecer ou se interessa por sua obra; ele era um autor popular, que, inclusive, permitia ao seu público, pessoas simples com quem convivia no cotidiano, interferirem em sua obra, e até sugerir mudanças... Sobre a repetição, que tanto se encaixa num como noutro dos casos aqui analisados, disse Ernst Gombrich: “descrições podem tornar-se aderentes...†E mais, apesar de toda essa polêmica os historiadores de arte do século XX deixam a discussão do sorriso da famosa obra Mona Lisa para o populacho, e se concentram na técnica mais ampla da composição, principalmente; técnicas, como a pose (que indica movimento), a idéia de profundidade da paisagem e até o enigma da identidade da modelo. O sorriso nunca é seriamente discutido, e terminará por voltar ao anonimato de antes, porque ali não há mistério algum, e sim, a representação de códigos sociais. Na verdade, há muita riqueza daquele perÃodo histórico na obra do autor, o que vai muito além do sorriso, que se dilui nesse contexto.
Interessante pensamento me ocorreu aqui; existe muita discussão (e não apenas na contemporaneidade) acerca de quem seria Beatriz, o discutido amor de Dante Alighieri, e muitas hipóteses foram propostas sobre o assunto. Apoiando-me nessa referência tentarei explicar a minha teimosia em fazer a analogia entre o olhar e o sorriso, sendo, no caso em questão, o sorriso um prolongamento da eloquência do olhar, que entendo o personagem principal, no caso da Mona Lisa. Em ConvÃvio,III, XV: â€
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