jorgete teixeira
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« em: Setembro 04, 2013, 11:30:42 » |
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A cama Take one A cama era toda a casa. O amor estendia-se no chão, demoradamente. Amavam-se contra as paredes, fuzilados pela submissão a um querer demolidor e insano, em cima das mesas em antropofagia desatinada, em equilÃbrio difÃcil sobre os móveis, nos parapeitos das janelas, em corrimões inventados. Amavam-se quando a saudade de si próprios, no enlaçar dos corpos, lhes era insuportável e os espelhos dos olhos embaciavam na ausência do outro. No inÃcio tinham o sol nos olhos e a urgência nas mãos. As horas derramavam-se e derretiam-se como relógios de Dali, entorpecendo os corpos, para os fazer entrar em convulsões de fogo e chuva, estendidos em lençóis de magma e de cetim… A cama estendia-se aos recantos encobertos, aos alpendres e jardins, a praias onde a sinfonia dos astros emudecia e se afogava dentro das bocas túrgidas. E na melodia que faziam ao amar-se assim, é que nasciam as fontes onde se saciava a poesia. Era ao som da orquestra da pele, bocas, lábios, espadas e rosas que se desfazia o medo e as madrugadas nasciam limpas e novamente puras. E o céu refulgia de cometas por inventar. Não havia fronteiras, nem esteios e a bússola eram os dedos em constante descoberta.
Take two Nada é mais belo do que um leito de amor. Nada é mais ingénuo, nada é mais crédulo. Nada fere mais quando nele se instala o ermo das palavras e dos anseios. Porque a paixão é supernova, esplendor estonteante que se desfaz em negritude… Esgotaram-se as noites, afunilou-se o amor e cada um voltou a ocupar o seu canto, uma tira de lençol onde os suspiros não se aventuravam a ir além da linha imaginada e um só rectângulo chegava na sobreposição rÃgida dos corpos… Agora a cama parecia o deserto onde o dorso se enovelava sobre si, fervilhando de pirilampos mudos, gozo só seu, feito de todos os momentos e de todos os homens que lhe passaram pela pele, misturados na mesma saliva e fluidos corporais. Corpo cego, abismado em solitude, embrenhando-se em labirintos de concupiscência. Dentro de si oásis de carÃcias espartejadas, flautas mágicas e guitarras de fina cintura em concertos de crisálidas por nascer…e a imensidão de areia onde serpentes chamejantes se escondiam. No leito de torturantes silêncios um corpo cavalgava sem montada. Em coreografia solitária, raÃzes húmidas cruzavam-se num céu de plúmbeas mágoas, enquanto uma morte suave lhe entorpecia os músculos cansados.
maria jorgete teixeira
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