josé antonio
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escrever é um acto de partilha
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« em: Janeiro 21, 2009, 20:18:37 » |
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LuÃs cultivava uma filosofia muito pessoal de estar na empresa e defender o seu lugar dentro da mesma contra todas as investidas desde os colegas até à s mais altas chefias, que sempre existem e se fazem sentir nas empresas. Quase todas. Assiduamente aconselhava os mais frágeis e incautos, depois de apanharem com uma avalanche de cinismo, desprezo e mau carácter a refugiarem-se por alguns minutos na casa de banho mais próxima, desabarem contra o protagonista os mais infames impropérios, em tom de voz, baixo, puxar a água do autoclismo e sair da mesma desanuviado, que é como quem diz – pronto para a seguinte. Os que acreditaram nele e experimentaram tal terapia, passavam palavra porque resultava. Ele sentia-se assim tipo guru da parapsicosociologia do trabalho ou por aÃ, um palavrão que havia treinado para impressionar, como o fizera e atingira a perfeição com otorrinolaringologista, que até as enfermeiras e médicas de medicina do trabalho gostavam de ouvir porque não conseguiam pronunciar com a destreza dele. Proezas. Fora isso era pacato, educado e bem-humorado – à s vezes em demasia para não ser levado a sério. Regressavam de mais uma reunião, daquelas em que a acta final é resumida no simpático: disse que disse – e assinada por todos sob o espectro da secretária do administrador, que para isso mesmo usava a secretária, em pessoa, como o Amaro, homem tÃmido, inibido por resultado e medroso por conveniência. Gastas quase duas horas de asfalto da auto-estrada, LuÃs começou a accionar o alarme de emergência. - Ou paras ou vai ser aqui dentro! Amaro, desculpava-se com a proibição que a lei lhe impunha de não poder encostar, porque tinha outro veÃculo a um metro da sua traseira, porque vira dois indivÃduos picados pelo retrovisor, porque não existiam árvores, porque podia surgir a BT, porque estava próximo duma estação de serviço, porque e porque e porque. Foi no momento em que a paciência de LuÃs se aproximou quase do zero absoluto para agarrar o travão de mão e suster a viatura que surgiu a placa indicativa do desvio a dois quilómetros para a estação de serviço. Amaro tendo percebido o que poderia ter acontecido, respirou fundo as vezes necessárias para regularizar o fluxo do oxigénio, do sangue e de todo o resto e ligou os piscas antes que LuÃs mudasse de ideias. LuÃs dirigiu-se de imediato à s casas de banho recomendando ao colega para arranjar mesa perto da porta. Amaro não podendo cumprir a ordem sentou-se na única mesa livre, junta à s estantes do self-service. LuÃs regressou e Amaro desfez-se em desculpas por não ter satisfeito o pedido de LuÃs. Como era seu hábito. E ele, descontraÃdo atalhou: - Fizeste bem, assim até temos a paisagem privilegiada das miúdas que estão na caixa. Bonecas. Estás a progredir Amaro! Levantaram-se para pegar o tabuleiro e os pratos favoritos, não sem que o Amaro tentasse apressar o LuÃs na escolha para retoma da estrada para cumprir o horário pseudo estipulado na minuta da reunião. A pressão foi tanta que passando à fase do empurrão LuÃs acabou por entornar sobre si grande parte do molho que adornava uns lombinhos de vitela com champighons – cogumelos, camisa abaixo. Sem palavras, Amaro ajudou no que pode a enxaguar a ribeira de molho de azeite, colorau e quejandos na camisa do colega, que sem comentários, sorria para ele e para a menina, também desejosa de lhe enxaguar o peito, mais, muito mais que o molho dos lombinhos. Pagaram, porque pré-pagamento e sentaram-se. Não permitindo a continuação do discurso de – mea culpa, mea culpa do Amaro, LuÃs voltou para a casa de banho para tentar disfarçar o máximo possÃvel os vestÃgios do derrame gorduroso na camisa, mais pelos comentários da esposa que das colegas da empresa à chegada. E ficou nas limpezas por cinco minutos. Os minutos suficientes para ter regressado com clientes e empregados hipnotizados como resultado dum assalto ultra rápido à caixa registadora por dois jovens que haviam fugido de moto. Amaro não se mexia. LuÃs sentou-se e completou calmamente a refeição. No final tomou a condução da viatura da empresa e chegaram com o escritório aberto e a chefia atenta. E a nódoa do molho dos lombinhos tapada por uma camisola com decote em barco esquecida por uma das filhas de Amaro no carro, que lhe assentava na perfeição.
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