Solidão Urbana (experiência)

[César]

Não consegui livrar-me dos decassílabos e dos hexassílabos, mesmo não os contando, senão depois, emendando alguns por vício. Nem sequer, vejo agora, me livrei da acentuação tónica na sexta sílaba, mas consegui libertar-me da rima, que, se me deu um à-vontade até agora não experimentado, me deixou a olhar para o que acabei de escrever. Vejo ainda que a forma é semelhante, em métrica, à do poema que fiz antes deste, Que Sabemos do Amor, só que sem rima. Mesmo este que ponho tem rimas irregulares (calmas/almas - fulgor/ascensor).

Peço que não estranhem eu comentar-me a mim mesmo. Há uma coisa que chama netetiqueta, mas nunca soube os seus mandamentos, talvez por pensar não ir precisar deles, e afinal agora talvez precisasse.

SOLIDÃO URBANA

Não são calmas as luzes, a cidade
na hora de ponta enquanto se esvazia.
Entrechocam-se as almas
que buscam nos passeios outras almas,
um olhar, um fulgor,
um indício qualquer que pare a busca
por entre a multidão
e as negue ao ascensor do dia-a-dia.

César

[Goreti Dias]

Isto não é comentar-se a si mesmo, o que não é bom fazer-se ( e não por netetiqueta). É uma explicação da sua experiência. Muitas vezes se pede aqui aos autores que nos expliquem algo que não alcançamos.
A poesia está muito além das rimas e dos acentos, mas também pode estar neles.

[César]

Domingos Mota

Concordo inteiramente consigo, embora esteja certo que navego em pleno séc. XVI quanto a versos (agora aqui eu punha, dirigido a mim mesmo, um destes smiles que estão aos saltos sobre o corpo da mensagem). Leio bastante poesia do séc. XX e deste, ainda que tardiamente tenha começado a fazê-lo, e também o que lhe está adjacente, artigos, um ou outro ensaio, etc. Mas, como sabemos, entre ler e escrever poesia vai a distância daquilo para que se nasce, que tanto pode ser grande como nenhuma.

Um dia, um amigo, colega da escola primária, que se revelou mais tarde como poeta, com livros publicados em editoras de referência, disse-me: "Faz a seguinte pergunta a ti mesmo: - Podes viver sem escrever poesia?" Respondi que podia, o contrário do que ele me confessou a seguir. É esta a distância de que falo acima.

Ainda assim tentarei escrever versos com cariz contemporâneo, para ver se fujo a espartilhos. O nosso moderador global, José António, denuncia-os com toda a razão na sua excelente quase sátira em verso. E a razão de José António é muito simples: hoje não se escreve como no séc. XVI.

Um abraço,

César