António Casado
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« em: Å¿etembro 03, 2014, 22:00:30 » |
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António Casado__________ 15 Maio 2009 Publicado__________ Clamor do Vento Registado __________ Depósito legal 306321/10 Editora__________ WorldArtFriend Trabalho__________
UMA PALAVRA… SEM SENTIDO -
O dia amanhece porque todos os dias amanhecem. Traz com ele uma alcofa de interrogações e medos. Desdobro os papéis enrolados das rifas do amanhecer e aguardo que alguma coisa mude. Cada uma delas acrescenta um alfinete ao rol dos lamentos. São os prémios obtidos num jogo que não escolhi, nunca entendi, nem quis. Alguns até me fazem rir de tão desonestos… rir é bom. É como nos despirmos do que provoca a sede de ficar e irmos livres e soltos de tudo o que nos rodeia. Nasce nas pontas das unhas um fio de luz transparente que nos trespassa e dentro de nós algo se agita e agiganta como se um infinito véu branco nos apontasse as portas abertas das cadeias de nós. Sinto-me livre. Sou livre! Que o digam as eternas horas à s voltas com os lençóis na desesperada tentativa de sentir o teu calor quando ainda neles te rebolavas comigo numa insónia muito perto da loucura; ou a frescura húmida do suor fruto do amor que fazÃamos; a roupa amarrotada quando te revolvias num sono agitado e eu beijava a tua testa e segredava-te contos tranquilos e belos. Que o digam elas quando sigo os fios de luz dispersos pela gaiola e tento desvendar as portas que sonhei escancaradas… É bem possÃvel que nem te apercebas da amargura que se enrola à minha voz e aperta a garganta para que não chore. Sabes porquê? Porque quando estás todo eu sou um sorriso latente na palavra no gesto e no olhar. Entrego ao desÃgnio das almas desesperadas as angústias que desabam sobre mim, a chuva de choros que afasto como se fossem insectos, a lenha encharcada da fogueira da paixão. Mas tu não vês. Porque tu não vês. Nem quando fico para segundo plano porque sou sempre o depois na tua vida e ainda assim aceito com um sorriso complacente o lugar que me reservas. Abraças-me e repetes como um papagaio que a vida é mesmo assim e as prioridades devem ser levadas em conta. Claro que sim meu bem… As prioridades! As tuas prioridades! Imagina meu querido que quando precisas de mim és a minha única prioridade! Quando te vejo feliz continuas gravado a fogo na minha mente como um único pensamento. Curioso… Reparo agora que ambos temos prioridades diferentes…!? As sombras nunca foram prioridade, são consequência. Talvez por isso passe pela tua vida como o contraste da luz. Como podes ver-me? Sabes que nada exijo. Exigir o quê? Se o meu amor não fosse o bastante que terrÃvel noite assombraria a nossa relação! Também de mim nada exiges. Dou-te tudo. Porque na minha mente caótica e perversa penso que sou teu e te pertenço como as árvores são parte integrante da floresta. Ao dar algo de mim sinto que preencho algo de nós como se um gesto de carinho fosse a fragrância necessária ao nosso bem-estar. Pedes-me um sorriso e abro-te as mãos, estendo os dedos, arranho as sombras e quando sorrio o coração abre as asas e poisa sobre o teu peito. Esse esvoaçar eleva-me acima das colinas do amor e em mim, no lugar da nascente da água cristalina que sempre brotou das veias, fica um espaço vazio que aguarda a presença do teu coração ardente para se sentar no trono da loucura e inventar o tempo de nós. Talvez apenas e só na minha mente… Falar de ti excita-me como se estivesses agora a meu lado… Penso no pássaro de fogo que entra pelas frestas da sensibilidade e aquece dentro do meu coração todos os motivos para sonhar contigo. Olho para o lado e o teu corpo franzino dança com a chuva e o vento diante do palco que criei para nós. Acalenta o vazio que ainda não foi preenchido, partido que está meu coração, a labareda de um desejo por incendiar, uma estrela por iluminar, um sol por nascer… A esperança! Agarro a esperança e coloco-a no vazio. Logo o fermento da ilusão vem atrapalhar a saudade do que não tenho e o perfume do pão cosido sacia-me temporariamente a fome provocada pela distância. Aquele braço que não se estende, a ponta daquele dedo que não me toca… Sobra-me o pão. Digo aos nossos amigos com um sorriso que sou feliz. Feliz por te ter… Infeliz por saber que não és meu. Para já basta a verdade… a minha verdade. Ela é o bastante para me proporcionar todas as fantasias possÃveis e reviver todos os delÃrios da nossa vida em comum… a que não temos. Ainda creio nela quando estás junto de mim e chamo-lhe todos os nomes bonitos que existem no dicionário. Numa folha de farinha escrevo o futuro como um par ou um duelo. Sou um Sancho que acredita nas tuas promessas e uma Alice convencida de que todos os finais são felizes. “Preciso da tua força†– Dizes-me e colhes da subnutrição o alento de quem está moribundo. Eu preciso do quê? Não sei… Talvez de ti. Se me perguntam por ti digo que virás… porque tu vens sempre! Nunca estás, nunca ficas, nunca vais… Sabem que te amo. Já me confidenciaram que não devo guardar grandes expectativas pois todos os indicadores apontam para um fim. Indicadores? Sim, as prioridades. De novo as eternas prioridades. A minha sombra calcina na demografia da transparência mais um sonho e responde que estão errados. É nesse erro que quero viver. Soubesses tu como têm razão… Nunca sei quando vens despido na pressa habitual de partir ou vestido no ócio de ficar. Irás sim, meu amor… Um dia dir-me-ás: “Gostei muito mas não posso voltar. Não sofras… Espera por mim… Talvez um dia…†Claro que não sofrerei… Já o faço. Que fósforo queimado puseste entre os dedos durante o tempo que estive apaixonado por ti, consumido na imoralidade de acreditar que desta vez estava certo? Acertei sim… no alvo errado. Estranhas a facilidade com que digo que te amo? Só estranho a dificuldade que tens em repetir-me. Sei que me desejas… nunca duvidei. Já pensaste que por uma estranha leviandade eu até posso querer um pouco mais que o que me dás? Meu amor, modestamente eu quero tudo. O teu sopro, o teu sorriso, a tua voz, a tua lágrima… São pedaços da grande pomba fulminante que voa de um peito para outro. O desejo que disseminas pelos lençóis é insuficiente para preencher o oco de um coração partido. Depois de satisfeito a alegria que exultas traduz-se na imediata frieza da ausência e no lugar que te destinei apenas encontro uma colmeia abandonada a aguardar o regresso da rainha. Entre uma coisa e outra suicido a presença e arremesso contra mim todas as culpas que o querer pode conter. Ainda que a palavra amor se lançasse do abismo da estante da ternura seria impossÃvel acreditar na espontaneidade. Desejares-me não é amares-me. Amando-te, desejo-te. Amor é só trocar a ordem das palavras e tudo parece um relógio suÃço. Tão fácil… E tão dolorosamente impossÃvel! Sei… Conheço as regras do jogo. Não posso queixar-me. No inÃcio éramos a perpétua aventura imergida dos sentidos como outra qualquer. Inconsequente e ousada. De livre vontade ocupaste o espaço que te dei e quiseste mais até de mim nada restar que não fosse tua pertença. Acreditei em ti e fui cedendo a minha vida até me perder no nada que restou. Quando olhei para trás só a tua sombra era visÃvel. Tomaste a minha vida nas tuas mãos, dominaste a dignidade, usurpaste a auto-estima, deixaste-me entregue a todas as promessas que segredavas ao ouvido. Em torno de mim criaste uma cerca cor-de-rosa da qual não queria sair. Cada palavra tua representava uma sensação de bem-estar e sorria para mim convencido de que o mundo lá fora sorria comigo. O enigmático fio invisÃvel que me ligava ao gueto era toda a felicidade. Ficava feliz com o que me davas. Pensava que partilhávamos as mesmas células, os mesmos anseios, os mesmos sonhos, o mesmo sexo…Quanta ingenuidade! Pouco a pouco descoloriram-se as cores do gueto. Depois… Tudo serviu de desculpa para te isolares no teu quintal sombrio onde nunca permitiste que entrasse e mentires. Argumentavas que estavas confuso… Que tinha sido o teu primeiro homem… Como podia eu saber? Abriste os braços para que me deixasse abraçar; sorriste para que me deixasse beijar; tocaste-me para que me desse… Sabias quem eu era. Nunca marquei um encontro… deixei que viesses. Vinhas… ficavas… amavas… Ainda me lembro de teres dito que fui a única pessoa com a qual foste sincero e que mantÃnhamos uma relação de tal forma aberta que não precisavas fingir ou mentir como sempre o fizeste com todos. Acreditei, porque quando se ama em tudo se acredita. Hoje sou eu quem telefona quando vê o sol raiar. Digo: “Bom dia, amor.†És tu quem anseia pelo meu telefonema. Dizes que precisas ouvir a minha voz. Também sei que te esforças para encontrar tempo para mim. Também sei tanta coisa pequenina, insignificante, banal… Ai amor, que culpa tenho eu se te amo cada vez mais?! Não me acuses de te pedir mais e mais migalhas. Só quero ter uma vida normal como todas as pessoas normais que vivem a mesma loucura em comunhão e regozijam-se da felicidade de serem livres e estarem disponÃveis para amar. Estou disponÃvel para amar! Quando a minha imagem se reflecte no espelho transparece uma auréola de paixão fruto de me aceitar como sou. Orgulho-me de te amar e ter a graça enorme de estar apaixonado. Sei que esse caminho me conduzirá à felicidade e é nele que travo as minhas batalhas diárias. Sim, sei, sou gay. Sou-o porque busco o amor em todos os horizontes consciente de que o irei encontrar. Quando terás coragem de fitar os teus olhos no espelho? Amor, tu és igual a mim. Não temo gritar pelas ruas que te amo porque te amo; não me escondo dos teus públicos beijos, porque os desejo; não recuso os teus braços porque suspiro por eles. Orgulho-me de ti. Por isso não entendo esta distância de um passo que me mata, me trucida e que aos poucos me vai fazendo descrer de mim. Amor, eu estou exausto. Afinal tanta coisa por uma palavra… Uma só que me fizesse sorrir… apenas uma palavra que alegrasse a minha existência. Compreende que não sou a acha que se atira ao lume… sou o fogo que a queima! Uma palavra… Talvez o nosso futuro dependa disso. Uma palavra… ainda que nem faça sentido! Se tu a dissesses e eu a ouvisse…
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