garras da tempestade

[Mel de Carvalho]

de bruços ao quotidiano entorpecido s’aporta o frio
imóvel
na (re)descoberta dum mundo
obstinadamente deposto em linhas paralelas – céu e mar,
céu e mar …

pouco me importa
se existe
somente a forma distorcida
e dela recidiva
a dádiva
a linguagem simples
da troca
d’osmose maior …,

a língua na tua língua
o corpo que se escorre em plasticidade no lago de teu corpo
a alma que se solta, pássaro de fogo,
no gesto amplo, inato, de te fazer voar
em quilha rubra
em asa aberta…
e ser voo, em plúmbeo estanho de um olhar…

é liquida a cor azul do oceano em baixo
é terna a mão que tece o laço…

basta-me.

debruço-me
questiono-me
na imobilidade de um véu de maya
que se amplia
que se alarga
que se (me) rasga em dor, cognata,
prazer parido em ventre oco
de mulher …

de bruços ao quotidiano inócuo
no isolamento do rito de passagem

barcaça
remo
rumo
e vaga
   busco!

agarro-me às garras da tempestade
quando, vagamente questiono
a frequência, a assiduidade da elocução,
quando monitorizo
a incidência proposicional que me deriva
gota-a-gota … no choro da nora
na queda d’água…
louca mordaça.

de bruços ao quotidiano inofensivo
sou de mim mesma, roteiro, peneira, roda de feira,
poalha leve, dum só sentido.

[Goreti Dias]

De bruços, roteiro e sentido!

[Mel de Carvalho]

grata, Goretti. é isso mesmo: debruçamo-nos num roteiro (muito) sentido e procuramos o sentido da rota.

Beijo
Mel

[Vanda Paz]

Lá garra não te falta não

beijocas