Hoje apetece-me falar, simplesmente falar mesmo que ninguém me ouça, mas é isso que me apetece fazer, escrever sem cessar, tal onda gigante que translada o mar e afoga meu coração, falar sem saber do quê, talvez do silêncio esse som perceptível e feroz que nos fere tal garras de um felino esfomeado, ou do teclado inerte e disponível para permitir o jorrar de pensamentos impetuosos no documento vazio.
Talvez seja melhor falar de ”mim”, que me lês indiferente, gélida… de mim que me sentes calada, amordaçada, de ti do outro lado de mim neste mundo paralelo de ambiguidades e ilusões, de realidades distorcidas e alienatórias.
Ou do tempo esse amigo único, fiel, amável que me consola na sua infinidade…que compreende e me ouve na imensidão do vácuo e do nada.
Falar de quê? Será que ainda existe algo para falar? Ou só existe algo para sentir e desejar nesta teia de oportunidades de escolha que a vida nos dá, ciente da nossa inteligência. Inteligência? Paro e reflicto, será que o ser humano é tão inteligente assim, será que eu sou inteligente ao ponto de conseguir escolher com sapiência o que quer que seja? Ás vezes penso que somos marionetas de um qualquer teatro perdido, imposto pela sua teatralidade inata.
Como posso falar de inteligência se quando deambulo por aí, sinto na minha pele humida, gotas orvalhadas que brotam de um céu infértil de estrelas, como se fossem lamentos de milhões de bocas famintas das terras áridas e desérticas clamando justiça…
Como posso falar de inteligência se percorro becos e ruelas e sinto o cheiro nauseabundo dos ratos mortos fedendo o ar e os pulmões de quem só quer sobreviver neste mundo desigual.
Como posso falar de inteligência se os meus ouvidos são perfurado pela voz metalizada que profere ordens insanas, delirantes, infestada com os germes da loucura, esquizofrénica da guerra
Como posso falar de inteligência se no meu olhar marejado, reflecte-se o olhar assustado e inocente de uma criança que me fixa de lá…onde o terror e o pesadelo se encontram.
Como posso falar de inteligência? Será que alguém me pode esclarecer?
Berro mas nada digo
O silêncio amordaça
as palavras
Destemperadas
perdidas no vácuo do nada
Falo mas sinto que não falo
Que as palavras não saem
Permanecem lá
Em ti, em mim em nós
Fúteis e desalinhadas
Ao sabor do momento
Apático e incongruente
Deste tempo passado
E sempre presente
Em mim, em ti…
Escrito a 18/09/08